Por Sara Leal*
Em outubro de 2020, o CONSERV fechou os seus primeiros contratos para compensar financeiramente produtores rurais em Sapezal, no município do Mato Grosso, por conservarem áreas de vegetação nativa, além da Reserva Legal, dentro de suas propriedades.
Descubra quem são os pioneiros que aceitaram fazer parte da iniciativa do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), como aderiram ao CONSERV e o que mudou desde a entrada no projeto.
O início
A história começa em março de 2020, quando após três anos de estudos – que constataram, dentre outras coisas, que Mato Grosso possui imóveis rurais que guardam 3,2 milhões de hectares de vegetação nativa, que correspondem a aproximadamente 134 milhões de toneladas de carbono estocado, e que por lei podem ser suprimidos – uma equipe do IPAM foi até Tangará da Serra (MT) para apresentar o mecanismo aos produtores rurais da região.
“Foi uma construção que nós fizemos: a junção dos conhecimentos do IPAM com a nossa experiência em campo com a agropecuária”, afirma Rui Wolfart, parceiro do IPAM responsável por apresentar os primeiros produtores a aderirem à iniciativa. “Hoje, o CONSERV tem provas concretas de que o mecanismo funciona e são muitos os interessados em participar”, complementa.
Atualmente, o projeto possui 22 contratos firmados no Estado de Mato Grosso e um no Pará, somando 20.707 hectares de vegetação protegida. Destes, 8.410 ha são dos produtores pioneiros de Sapezal – município com a maior concentração de plantações de algodão no Brasil, 14% do total nacional.
Os pioneiros CONSERV
Natural do Paraná, Redi Biezus migrou para o Mato Grosso na década de 80. “Há muito tempo eu tinha a intenção de participar de um projeto como o CONSERV. A primeira surpresa foi de fato entender que estava se tornando realidade um anseio antigo”, afirma.
Segundo ele, os recursos oriundos do projeto foram investidos na propriedade e na qualidade de vida dos funcionários. “O investimento faz com que eles se sintam melhor no ambiente de trabalho e queiram nos ajudar a cuidar da estrutura como um todo”, explica.
Fernando Paim é do Rio Grande do Sul e foi para o Mato Grosso em 1989. Ele acredita que o momento é importante para demonstrar que há produtores rurais que desejam conservar. “Também mudou nossa visão sobre organizações ambientais. Acreditávamos que havia um certo antagonismo entre os interesses delas e da nossa categoria. Com o projeto, buscamos um entendimento”.
Para Ari Malacarne, o sucesso do mecanismo se deve à junção de fatores que se complementam. “Beneficia o meio ambiente e também a produção. Com ele, nós temos agricultura, gado, água e floresta”.
Malacarne é natural do Paraná e chegou em Mato Grosso no ano de 1996. Ele afirma que o projeto incentivou algumas mudanças nas propriedades. “Nós já preservávamos, mas não dentro de um padrão de combate a incêndios ou manutenção de áreas de preservação permanente”, explica.
“Além da satisfação em contribuir com a preservação, a iniciativa nos faz olhar permanentemente para essas áreas com outros olhos. Buscamos novas formas de cuidar e melhorar a propriedade, inclusive mostrar isso para os nossos filhos e colaboradores que trabalham na fazenda, fomentando a conservação”, complementa Biezus.
As propriedades antes e depois do projeto
Atualmente, o grupo conta com uma brigada de incêndios iniciada por Carlos Roberto Simoneti, um dos pioneiros CONSERV, que foi do Paraná para o Mato Grosso em 1984. O produtor possui a maior área individual contratada pelo projeto (3.624 ha) e decidiu investir parte do valor pago pela iniciativa em ações de combate a incêndios, como a compra de um caminhão pipa e a aquisição de cursos para capacitar seus funcionários contra queimadas, especialmente na época da seca.
Simoneti e outro produtor pioneiro, Jaime Muraro, construíram recentemente um poço artesiano para fornecer água para o gado – evitando que invadam rios – e abastecer rapidamente o caminhão pipa em caso de incêndio. “Também aplico o valor que recebo do projeto nas áreas consolidadas e melhorias da fazenda, como adubo, calcário, o que aumentou a nossa produtividade”, explica Simoneti.
Segundo Redi, a chegada do CONSERV na região também fez com que os produtores vizinhos às propriedades passassem a entender melhor a importância da preservação ao ver a união dos produtores do projeto. “Eles veem nosso movimento de aumentar os cuidados com essas áreas e passaram a ter mais consciência sobre isso, o que faz com que contribuam automaticamente”.
A visão dos produtores sobre o futuro do CONSERV é unânime: todos gostariam de continuar no projeto. “O desejo é que ele cresça e se torne também uma política do governo”, afirma João Luiz Traesel, que saiu do Rio Grande do Sul para o Mato Grosso em 1989.
Também natural do Rio Grande do Sul, Jaime Muraro chegou em Mato Grosso no ano de 1980. Na época, ele já vislumbrava o surgimento de um mecanismo que remunerasse produtores pela conservação. “É uma forma de todos apoiarem a preservação, que beneficia o planeta. O CONSERV é um início. Espero que surjam mais apoiadores para que o projeto se expanda para outras regiões. O que não falta são produtores interessados”, reforça.
Sobre o CONSERV
O projeto CONSERV reconhece o papel do produtor rural na manutenção da vegetação nativa e propõe um novo modelo no qual a conservação é aliada ao desenvolvimento. Lançado em 2020 e desenvolvido pelo IPAM – em parceria com o EDF (Environmental Defense Fund) e com o Woodwell Climate Research Center -, nesta etapa, o CONSERV opera em municípios de Mato Grosso e do Pará, nos biomas Amazônia e Cerrado.
*Coordenadora de comunicação do IPAM, sara.pereira@ipam.org.br
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